Hoje, todos temos conversas privadas por escrito. Ora, isso é coisa que há umas décadas era raríssimo. Entre amigos, ou bem que conversávamos em alta voz — ou usávamos cartas e postais, que tinham os seus rituais e formalidades. Aliás, hoje escrevemos mais nos chats e messengers da nossa vida num só mês do que numa vida inteira das cartas de antigamente. (Bem, havia quem escrevesse imenso nas suas cartas — mas eram excepções numa imensidade de gente que simplesmente não escrevia.)
O português destas novas conversas informais por escrito está cheio de abreviaturas, emoticons, hesitações, repetições, distracções e até palavrões — alguns, mais atinados e sempre de fato inteiro, acham tudo isso um sinal da decadência da língua. Mas, vá, admitam lá: as conversas privadas sempre foram muito pouco formais e muito expressivas — lá por agora conversarmos por escrito, não vamos passar a falar com os nossos amigos como se estivéssemos a discursar, certo?
Agora, essa informalidade pode trazer-nos um problema. Poucos se lembrarão de escrever um relatório em linguagem de chat. Mas quando publicamos qualquer coisa no Facebook, sem restringir a privacidade aos nossos amigos, estamos a escrever em público — mas usando a mesma ferramenta com que conversamos em privado. Escrevo no chat e, centímetros acima, um post público. É compreensível que a fronteira mental entre os dois mundos se esbata. Tudo isto leva a que a escrita pública no Facebook seja mais informal do que noutros meios — e quanto a isso nada tenho a apontar. Terei até muito a louvar, digo-vos. Mas o certo é que também será essa uma das razões por que encontramos no Facebook muitos textos públicos escritos com o mesmo descuido com que conversamos, por escrito, com os amigos.
Já sabem (pelo menos quem lê este blogue há algum tempo) que não ando por aí preocupadinho com a língua, como se vivêssemos nos tempos do fim da língua — e, aliás, tento combater essa atitude alarmista de quem anda a ler à caça dos erros dos outros. Dito isto, preocupo-me com cada falante da língua em particular, a começar por mim. Por isso, parece-me importante guardar aqui, neste artigo de blogue, algumas sugestões sobre como melhorar a escrita em público.
Há muita coisa a dizer sobre a escrita, mas para começar por algum lado, apetece-me falar de pontuação — ou pelo menos sobre alguns aspectos em que muitos erram quando escrevem no Facebook. Porquê a pontuação? Porque será dos aspectos em que podemos melhorar rapidamente.
Mas antes das tais dicas, convém esclarecer que estes descuidos não são mesmo sinal de decadência — o que se passa é só isto: há umas décadas, muito poucos tinham de se preocupar em preparar textos para publicação. Hoje em dia, todos nós escrevemos em público — e, por isso, todos nós ganhamos se usarmos bem os sinais gráficos da escrita.
É isto importante? Não é, certamente, o mais importante. Podemos seguir todas estas dicas e mais algumas (há tantas outras!) e esquecer aquilo que vale bem mais: pensar bem, discutir de forma correcta, estruturar bem as ideias no texto, conseguir cativar quem nos lê. Mas a pontuação têm alguma importância, pois um texto bem escrito com pontuação anárquica afasta os leitores e deixa quem escreve mais longe de conseguir fazer o que quer com a língua portuguesa — a minha definição pessoal de «escrever bem».
Pois bem, depois desta introdução a dar para o gigante, aqui ficam algumas dicas sobre pontuação. Não é um guia exaustivo, apenas ideias avulsas para quem escreve no Facebook.
- Os pontos e as vírgulas levam um espaço a seguir, mas nenhum espaço antes. Isto também vale para os pontos de exclamação e de interrogação. «Concordo contigo!» — e não:
«Concordo contigo !» - A abreviatura de «número» é «n.º» (com ponto) e não
«nº»(sem ponto). - O travessão (—) é diferente do hífen (-). O travessão usa-se para introduzir diálogos e para dividir as frases. O hífen usa-se dentro das palavras, por exemplo em «diz-se» ou «fim-de-semana». Os dois sinais são diferentes e convém distingui-los em qualquer texto publicado (em papel ou na Internet). [Para usar o travessão no Mac, basta carregar ao mesmo tempo na tecla de opção (alt) e no hífen; no Windows, carregamos ao mesmo tempo nas teclas ctrl, alt e hífen numérico.]
- Entre as aspas iniciais e a palavra imediatamente seguinte não deve existir nenhum espaço. Da mesma forma, não devemos usar nenhum espaço entre as aspas finais e a palavra imediatamente anterior. Assim: «Estas aspas estão bem.» |
« Estas aspas estão mal. » - O uso da vírgula merece um artigo só para ele: lá chegaremos. Mas adianto-me já: grande parte dos erros que vejo parecem-me ser por excesso de vírgulas. Seja como for, devemos usar um espaço depois da vírgula — mas nunca antes!
- Se uma sigla termina em ponto, não é preciso repetir o ponto no final da frase. Assim, a frase «Já fui aos E.U.A.» não precisa dum segundo ponto no fim.
- Na escrita pública, parece-me um erro usar pontos de exclamação em duplicado ou triplicado. O exagero no uso da pontuação dá um aspecto infantil aos textos, sem que fiquem mais fortes ou persuasivos. Será um pouco como usar gestos teatrais ao falar em público. Além disso, usar !!!!! a seguir a uma frase dá um aspecto de descontrolo emocional — o que pode não ser o caso, claro está (estamos a falar de impressões). Diria mais: o próprio uso de um só ponto de exclamação deve ser moderado, para que esse sinal de pontuação não perca a força. Uma vez por outra, deixar esta dica de lado faz muito sentido, se aquilo que dissermos for extraordinariamente importante — se formos poupadinhos nas exclamações, todos vão ler com mais atenção o que escrevemos no dia em que, por fim, lá pomos dois pontos de exclamação no fim duma frase!!
- Talvez não seja boa ideia exagerar nos emoticons. Nada contra o uso desses desenhos, que até dão muito jeito nas comunicações privadas para adocicar a mensagem e não deixar a frieza do ecrã infectar as nossas conversas. Mas nos textos públicos devem ser usados com conta, peso e medida — até para não perderem valor (tal e qual os pontos de exclamação).
- Fugindo um pouco à questão da pontuação… No Facebook não temos a possibilidade de usar o negrito, mas podemos usar as maiúsculas nos títulos — e até para substituir itálicos. Não é o ideal, mas temos de adaptar as convenções às limitações do meio onde estamos.
- Da mesma forma, em vez do avanço inicial de cada parágrafo, julgo que é mais fácil para os olhos que lêem num ecrã ter uma linha entre parágrafos (como neste blogue).
Esta lista é para ir sendo completada ao longo do tempo… Se alguém quiser sugerir alguma outra ideia, ficarei muito agradecido.
Agora, o aviso do costume: quem quer escrever melhor, mais do que seguir esta ou outra lista de sugestões, o melhor é pôr-se a trabalhar — ou seja, a ler. E muito! Porque quem lê muito começa a perceber as regras da escrita de forma intuitiva — começa a ser nativo de português escrito, se quiserem pensar assim.
E, por fim, diga-se que, no Facebook, o importante é viver bem — dizer qualquer coisa de importante, deixar um sorriso nos lábios dos outros, partilhar ideias, notícias — viver um pouco mais perto dos outros através da nossa língua portuguesa… 😉
Na secção sobre as aspas, a explicação contraria a prática e o exemplo dado, não?
Fui ler de novo, mas parece-me tudo bem. Estarei a ver mal?
Vou, de qualquer forma, reescrever o parágrafo para tornar a frase um pouco mais clara.
Muito bom. Obrigada pelas dicas!
Gostei imenso das dicas. Comecei a visitar este blogue por sugestão dum meu professor de comunicação. Tenho apreciado muito. bem haja, Marco Neves!
Não concordo com o uso de maiúsculas no lugar do negrito. É preferível usar asteriscos no princípio e no fim da palavra ou frase que se pretenda em negrito. Exemplo: *Isto está em negrito*, mas isto já não está.
Obrigado pelo comentário é sugestão. São duas opções válidas para contornar a impossibilidade de usar o negrito. A escolha de uma ou outra é uma questão de preferência.
Já aprendi duas coisas hoje. Não fazia ideia que há diferença entre o Traço e o Travessão. e não sabia que fazendo CTR+ALT+ – dava um sinal diferente, que no caso será o Travessão.
Entretatnto, descobri que o tal travessão que se consegue fazer no word, aqui na caixa de comentários, não funciona…
Mas gostaria de deixar um comentário ao post em si; creio que temos aqui uma confusão: Que é confundir os posts em Facebook com o “escrever em público”.
Não me vou alongar sobre o assunto, mas mesmo para quem seja (exemplo) professor e tenha centenas de seguidores, um post em Facebook (mesmo que seja posteirormente replicado e triplicado), destina-se *prioritariamente* aos conhecidos (ou menos conhecidos) e seguidores de quem o ‘postou’ e não propriamente a divulgação pública.
O meu comentário *não* se aplica, quando o post se destina mesmo a uma comunicação mais séria ou oficial.
Aí sim, terá que se ter todo o cuidado com essa escrita.
Depende das configurações de privacidade: tenho alguns posts de Facebook que são públicos e acessíveis a qualquer pessoa que os procure. São lidos, por vezes, por algumas centenas de pessoas (e o mesmo acontece com muitos de nós). Para mim, já é suficientemente público para merecer mais cuidado do que as conversas entre amigos (ou os posts que estão configurados para serem lidos só pelos amigos). Claro que, mesmo assim, não devem ser tão formais como comunicações sérias de instituições ou empresas… 🙂
Segundo o genial gramático dr. Napoleão Mendes de Almeida, não se deve colocar ponto antes das aspas finais, certo é depois, como neste exemplo: “Estas aspas estão bem colocadas”. Até então esta regra é seguida em todas as publicações de livros, jornais, revistas etc. É pior que colocar vírgula antes de “etc.”, que já quer dizer “e mais”.
Obrigado pelo comentário. Não é essa a prática em Portugal, onde a pontuação fica dentro ou fora das aspas como explicado no texto acima.
Um erro que encontro com muita frequência é a confusão entre palavras como «disse-se» e «dissesse”. Muitas vezes encontro a primeira em vez da segunda.
Enganei-me na aspa final. Não reli o texto com atenção.