Ora, por estes dias anda a apetecer-me escalpelizar os lugares-comuns de um certo pessimismo repetitivo. Como já vos disse, não é que seja optimista — só me parece que não devemos ser preguiçosos quando andamos a dizer mal do mundo.
Agora, foi o director da Visão que entrou pelo habitual «ai, os jovens, que não se interessam por política». Andava eu na escola primária e já os jovens não queriam saber nada de política — tirando os que queriam.
O curioso é que João Garcia apresenta (como, aliás, é de bom tom) o argumento contrário, para o desmontar. Diz ele, depois de descrever uma daquelas reportagens em que um jornalista pergunta a jovens quem são os candidatos e eles respondem «não sei» (ou outra coisa do género):
Podemos meter a cabeça na areia e achar que a culpa é do repórter que andou a escolher os entrevistados a dedo, só citando os mais desinteressados e desinteressantes. É o mais fácil e tranquilizador. Mas também podemos acreditar que há aqui um sinal de que algo está a mudar.
Ora, antes de mais, é de facto refrescante ver alguém a apresentar os argumentos contrários. Mas convém reconhecer que isto não é uma questão de acreditar ou não. Ou bem que os jovens andam a votar mais ou andam a votar menos. Há números…
E, sim, os jornalistas podem mesmo escolher as respostas mais desinteressantes para estas reportagens. Este tipo de caça ao jovem burro é quase um género por si só e presta-se a manipulações que, acredito, serão muitas vezes inconscientes. Já vi um jornalista, à porta da minha faculdade, a ficar visivelmente desiludido com as respostas certas de um ou dois jovens.
Aliás: como sabemos, notícia é o homem que mordeu o cão, certo? Se eu quiser ser malandro, posso dizer que ficarei preocupado no dia em que aparecer uma notícia em que um jovem acerta numa resposta. Podemos então supor que todos os outros andam a errar.
Mas o que pode um jornalista fazer? O que já muitos fazem, felizmente: olhar para os números. Perceber quantos jovens pensam votar. Quantos sabem quem é Marcelo (e os outros candidatos). E comparar — com a população de outras idades e com os jovens de outras épocas.
Mais ainda: pode ouvir jovens interessados e jovens desinteressados. Não precisa de estar sempre a bater no mesmo lado…
Não é, por isso, uma questão de ser optimista e enterrar a cabeça na areia ou de ser pessimista e acreditar no cada vez maior desinteresse dos jovens: é uma questão de medir esse interesse ou desinteresse, olhar para exemplos variados e, a partir daí, procurar saber um pouco mais.
Porque, de facto, jovens há muitos e alguns até são bem interessantes e interessados.
“[…] Mas convém reconhecer que isto não é uma questão de acreditar ou não. […]”
Referência ó “Acredite ou Não” (imagino que sem sabê-lo).