Certas PalavrasPágina de Marco Neves sobre línguas e outras viagens

Afinal, no Porto diz-se «cimbalino» ou não?

coffee-939433_1280

Na terra onde nasci e na Lisboa onde acabei por ir parar, sempre ouvi muitas pessoas usarem a palavra «cimbalino» como exemplo de vocabulário do Porto.

Sim: «cimbalino» no Porto, «bica» em Lisboa. Tal como «fino»/«imperial» e outras saborosas diferenças.

Ora, as palavras às vezes surpreendem-nos.

Ali por volta de 2009, a empresa onde trabalho abriu um escritório no Porto e conheci a Ana Filipa, a cara do novo escritório.

Nas semanas que lá passei nessas alturas do arranque, aproveitei para lhe perguntar sobre o famoso «cimbalino».

A resposta surpreendeu-me:

«Cimbalino? Nunca ouvi tal coisa!»

«A sério? Mas olha que até já ouvi dizer que a palavra vem da marca das máquinas, ou lá o que era…»

«Pois, não sei, mas nunca ouvi ninguém usar…»

Perguntei a outro colega do Porto e ele também me disse que nunca tinha ouvido tal coisa.

Fiquei a coçar a cabeça: pergunte-se a um lisboeta o que é um «cimbalino» e responderá, sem hesitação, que é a bica do Porto. Pergunte-se a um portuense e a resposta será uma grande interrogação.

A verdade é que, na empresa, andamos todos entre os 30 e os 40. Talvez seja uma questão de gerações…

Pois, hoje, a passear no Facebook, encontro alguém que afirma sem hesitar que esta palavra deve ter morrido por volta dos anos 70.

Será isso, então? Uma palavra que já foi do Porto, mas que hoje sobrevive apenas na imagem que os lisboetas têm desse mesmo Porto?

 

RECEBA OS PRÓXIMOS ARTIGOS
Autor
Marco Neves

Professor na NOVA FCSH. Autor de livros sobre línguas e tradução. Fundador da Eurologos.

Comentar

11 comentários
  • Na verdade, eu que nasci no Porto e só o abandonei com 49 anos, não conhecia outra palavra que não “cimbalino” para pedir o que mais tarde foi substituído por “café” e até “expresso”. Nunca soube a origem da palavras, mas deduzi que tinha a ver com a marca das máquinas de café, já que todas que observava, tinham inscrito “Cimbali”. Quando cheguei ao Algarve, onde vivo, tive de me desabituar desta designação, pois ninguém me entendia. Tive, também, de deixar para trás o “fino” e mais caricatamente, “umas águas”, pois os funcionários interrogavam-me sempre: Mas afinal qure uma ou duas? Encantos da língua. Tive que aprender que alcagoitas são amendoins e que griséus são ervilhas. Que ir à da… é ir a casa da… que estar marafado, é estar aborrecido. Ter falta de faltar é ter necessidade de faltar… Continuo a aprender e a encantar-me.

    • A minha deslocação foi do Algarve para Lisboa. E conheço todos esses termos, embora não os utilize. Mas uma que é frequentemente utilizada em casa e que já passou para as gerações seguintes é: Cedoira. A comum base que se coloca na mesa para pôr techos quentes em cima e não queimar a toalha.

      Na verdade, como o Marco várias vezes referiu ao longo dos seus posts, a normalização da lingua por força da rádio e televisão, tem sido generalizado.

      Tirando um ou outro, mesmo no Porto já ninguém pergunta o que é uma imperial, mas acredito que se alguém pedir uma imperial e umas alcagoitas para acompanhar, alguém ficará a olhar para nós e a pensar em que lingua estamos a falar…

  • De facto, no início e meados dos anos setenta, ainda se usava a palavra “cimbalino” para pedir um café expresso, de máquina (as mais comuns no Porto eram, de facto, da marca “LACIMBALI” e que ainda se vêem frequentemente no Porto e no chamado “Grande Porto” – Gaia, Matosinhos, etc. (http://www.cimbali.it/), por oposição ao café de saco que ainda se servia em muitos cafés (mesmo, por exemplo, no “famoso” Piolho (café de estudantes, junto à Faculdade de Ciências da época e actual Reitoria).
    Entretanto, fui obrigado a deslocar-me para o sul (Lisboa, Setúbal, Alentejo…) e habituei-me a pedir café, bica…, e quando voltei – aí por volta de 1984 – já era muito menos comum falar-se em cimbalino. Sentia-se que, de facto, o termo caíara rapidamente em desuso. Parece-me também que as novas gerações não sentiram necessidade deste termo e esqueceram-no…
    Efectivamente, o café de saco estava também a desaparecer… Será que deixava de ser necessário distinguir entre um e outro: o expresso – à italiana – e o de saco? ´ Acho que é uma hipótese a considerar.
    Agora, quando se pede um café ( no Porto) a preocupação é outra: distinguir entre curto, médio ou comprido!…

  • Na verdade cheguei a pedir cimbalinos e cafés de máquina no Porto e ainda me recordo de que no “Piolho” só tinham café de saco.
    Mas também tive o prazer de beber do melhor café num estabelecimento que tinha o nome da marca de café que servia e que ficava “à beira” dos Clérigos, denominada Montarroio, uma especie do que houve em lisboa na baixa chamado Café Puro.
    Enfim outros bons tempos.

  • Existe uma diferença entre dizer que se é do Porto, e ser Portuense; 95% dos cidadãos que habitam ou trabalham na Cidade do Porto, não são Portuenses, daí o desconhecimento acerca da palavra Cimbalino, a sua origem, e tradição.

  • Da origem do cimbalino

    «Em 1956 a boa fama profissional da ofi­cina de Manuel Ferraz levou a que fos­se escolhida para agente da marca La Cimbali, moderna máquina italiana de ti­rar cafés. Porfírio foi a Itália fazer uma es­pecialização para poder reparar as no­vas máquinas, cuja primeira foi montada no Café Central, em Anadia. Seguiu-se a montagem de máquinas nos cafés Águia d’Ouro, Palladium, Âncora dOuro, Tropi­cal, Brasileira e Confeitaria Lobito (Largo do Padrão) no Porto, e nos cafés Sport e Pátria, em Matosinhos.»

    Sempre pedi cimbalino quando queria um expresso, e sempre ouvi dizer que a origem da palavra veio do facto de a primeira maquina de cafe que deu origem ao cafe expresso se chamava CIMBALI dai que o povo tenho dado o nome ao café tendo por base o nome da maquina e concluindo o nome com mais algumas letras para facilitar a finalizaçao da palavra oralmente em vez de cimbali acharam mais pratico chamar cimbalino e penso que foi por isso que o nome ficou.
    Hoje em dia ja nao peço um cimbalino mas sim um café.

  • Viva! Parabéns pelo blog.
    Quem não ouviu falar de cimbalino, sendo um tripeiro não será pessoa que ande na rua, deve ter fugido da vida social da cidade. No Porto só mesmo a morada de residência….

  • Lá está o poder da comunicação nas mãos de gente nova em idade, ignorante de muita coisa apenas porque é nova. E fazem afirmações taxativas! É quase uma fakenews! Efetivamenteaqui há uns anos, pedir uma bica no norte, podia até ter uma reação menos boa por parte do comerciante. Cimbalino ou café..

    • Quando fala de “gente nova”, está a referir-se a quem? É que o artigo que está a comentar está cheio de interrogações, é tudo menos taxativo…

Certas Palavras

Arquivo

Blogs do Ano - Nomeado Política, Educação e Economia