
«Labrego»
O primeiro falso amigo é muito inocente. Longe de ser para maiores de 18, é para todas as idades. A verdade é que é difícil encontrar portugueses que não se riam quando descobrem que, na Galiza, existe um Sindicato Labrego Galego.
Sim, um labrego, na Galiza, é apenas e só um lavrador. Já um labrego, em Portugal, até pode ser um lavrador — mas também há labregos fechados em escritórios ou vestidos de fato inteiro. Não consta que, por cá, se tenham organizado num sindicato.
«Grelo»
A história ficou famosa, pelo menos entre quem liga a estas coisas. O município galego de As Pontes promove anualmente um festival do grelo. Nada contra: comer verduras faz bem e um festival deste tipo só pode ser coisa boa.
O festival é coisa em grande, pois até tem um website — compreende-se que o município tenha decidido traduzir o tal website para espanhol a partir do original galego.
Abrande agora o leitor, como fazem tantos condutores ao passar por um acidente. Pois aquilo que aconteceu foi um autêntico acidente de tradução. Com feridos graves!
O nome do festival — ou da feira — era bastante claro em galego: «Feira do grelo».
Já a tradução para espanhol ficou, no website, com este lindo aspecto: «Feria clítoris». Não contente, o texto continuava: «El clítoris es uno de los productos típicos de la cocina gallega.» — o que, imagino, deve surpreender bastante os peregrinos que chegam a Santiago…
O que se passou?
Bem, o município decidiu poupar na tradução (ah, não façam isso!) e foi ao nosso amigo Google Translate. Ora, a Google usava o português para alimentar o motor de tradução de galego para espanhol. Resultado? O inocente grelo galego deu uma guinada, transformou-se na palavra portuguesa e foi embater num muro a grande velocidade, deixando os responsáveis do município com as faces bem ruborizadas de vergonha.
Note-se, já agora, que o Google faz isto porque o galego e o português, enfim, estão muito próximos. Ora, lá está: a proximidade, por vezes, também nos prega umas rasteiras.
Algumas notícias sobre o caso saíram em jornais como La Voz de Galicia, JN ou The Guardian.
(Quem pela primeira vez me falou dessa particularidade do Google Translate no que toca ao galego foi o meu amigo José Ramom Pichel — convido o leitor, já agora, a conhecer o seu blogue, onde escreve sobre o galego e os seus labirintos: Quatro Estômagos.)
«Bico»
E pronto, chegámos ao último falso amigo — e que falso amigo! Capaz de atrapalhar uma inocente conversa… Pois o que acontecerá a um galego que conhece uma portuguesa e lhe propõe um bico na despedida? Leva um estalo? Desatam a rir? Ou?…
A verdade é que, sem malícia, os galegos chamam «bico» e «biquinho» ao «beijo» e «beijinho». Vejam dois apresentadores atrapalhados a explicar o sentido português neste programa que a Televisão da Galiza emitiu — faz parte da série de vídeos que aproveita a transmissão dos Morangos com Açúcar para ensinar português aos galegos:
Note-se que nestes vídeos algumas formas portuguesas são apresentadas como mais genuínas (por exemplo, o infinitivo pessoal) — ou seja, os apresentadores usam o português para ensinar um pouco de galego.
Não é curioso?
Este é o meu primeiro comentário neste blogue que já sigo a algum tempo.
Em primeiro lugar, parabéns pelo magnífico trabalho e muito obrigada pela partilha.
Hoje, chamou-me a atenção a caricata história do grelo traduzido no Google tradutor que já tinha lido algures. Aqui no Minho, ou pelo menos aqui em Guimarães, grelo tem o mesmo sentido malicioso que na Galiza. Tudo bem falar-se numa molha de grelos ou em grelos, mas dizer grelo no singular, se não quiser mal interpretado, será que ter o mesmo cuidado que em terras Galegas.
Adoro esta diversidade, seja entre Galiza/ Portugal, seja pelas pelas várias regiões do nosso país. Que o diga a minha filha, neste momento a partilhar a vida académica em Coimbra com vários colegas das mais diversas partes do país e as discussões acaloradas que ora no significado e nome dados a certos utensílios do dia a dia, ora em expressões.
Continue o bom trabalho, continuarei à espreita.
Os tradutores automáticos “cheiram pelo ar as palavras” e “pensam” que são portuguesas. Por isso é que fazem asneiras.
Devo introduzir um comentário sobre “labrego”: um “patrúcio” dono de “casa” nunca dirá que é “labrego” mas “labrador”. Um labrego pode ser um “jornaleiro”, não proprietário de eiras e leiras.
A teima portuguesa como o “grelo” tem piada: como é que vocês chamam um grelo, um só elemento no conjunto dos grelos que se comem com a pescada, por exemplo?
Para rirem a gosto, viajem até a bela e histórica vila de Monforte de Lemos. Lá no alto verão o letreiro grandíssimo do “Restaurante O Grelo”. Come-se muito bem nele.
Quanto ao “bico” acrescento aquele poético “Na fronte umha estrela e no bico um cantar”. Porque bico é o conjunto dos lábios da boca…
Finalmente nada mais simpático que o que primeiro me contou um filho, testemunha do feito, e despois correu como pólvora nas redes: um conselheiro da Junta da Galiza levou a uma feira da turismo a Madrid uma tradução feita às pressas com tradutor automático. Ao falar de “Sobrado dos Monges” o tradutor convertera-o em “El Desván de los Monges”…
Vocês portugueses são um povo feliz. Não sofrem da diglóssia tremens dos coitados galegos. Libre-vos Deus de cairdes baixo a férula de Madrid.
E convém ainda acrescentar ao “Bico” o sentido dado pelos nossos irmãos Brasileiros, em que “fazer um bico” não é nada mais que “fazer um biscate”, um trabalho temporário…
Coisa que muito divertida é quando (sobretudo) uma brasileira (recentemente chegada a Portugal) chega a um qualquer café e pergunta ao dono se pode “fazer um bico”.
Na minha terra “um bico” tem também essa designação de biscate, trabalho em part-time.
Desconhecia que grelo tivesse tanto significado diferente. E haja Deus que alguém aproveitou “Morangos com açúcar” para alguma coisa útil.
Esses tempos verbais, ditos assim, tiram vontade a uma pessoa:).
Boa, qual a sua terra?