Palavra perigosa: futebol.
Na sua fúria de condenar o mundo — em especial o mundo dos que não são exactamente iguais a elas — algumas almas muito sérias condenam o futebol sem possibilidade de recurso. Estas condenações vêm em muitos sabores: são os salários dos jogadores que irritam, é a corrupção que é imensa, são os comentadores parciais e maus estilistas da língua. Mas acima de tudo é isto: o povo, coitadinho, que se aliena ao ver uma bola a rolar. E é tudo tão desinteressante, não é? Uns homens atrás duma bola. Que chatice! Ora, que ninguém sinta a mínima pressão para gostar deste desporto. Não gosta? Eu também não gosto de muitos desportos e não me queixo. Vejamos: salários milionários há por aí aos pontapés; corrupção também existe na política e ninguém quer acabar com a dita (giro era acabar com a corrupção). A língua? Há comentadores que lhe dão uns toques como se fosse a bola nos pés do Ronaldo. Só é preciso estar de ouvido atento e menos medroso. E a alienação? E as gentes que não desgrudam do ecrã? Aqui é que me vem ao de cima a indignação: então acham mesmo, ó senhores, que uma pessoa que gosta de futebol só gosta de futebol? Haverá os obcecados — admito — mas a grande maioria de nós outros, meros espectadores dum desporto de massas (o horror, o horror!) gostamos disto e de tanto, tanto mais. E há gente para todos os gostos que vai ter o coração a bater durante o jogo de logo à tarde. Alienados? Durante aqueles minutos, é bem capaz. Mas a vida é mais do que aquilo que cada um de nós decide fazer durante 90 minutos. A vida é imensa e até inclui o futebol. A safada.
Vá, tirem lá os cachecóis das gavetas e toca de gritar!